
A orgânica do novo governo não obedece a nenhuma lógica de organização, de modelo ou de planeamento estratégico tendo em vista o desenvolvimento do país e o interesse nacional. Tem apenas como objetivo criar a ideia de que tem prioridades e dar resposta a eventuais críticas. Para este novo governo, tal como para o anterior, não interessam as políticas e muito menos as reformas, a prioridade continuará a ser dada apenas e só à comunicação. Provavelmente o modus operandi será mais ou menos o seguinte: quando alguém criticar o Governo por estar a falhar nas metas ambientais, António Costa dirá “mas até mudámos o nome do Ministério do Ambiente para Ação Climática, esse é o caminho de futuro”; quando voltarmos a denunciar a falta de investimento no interior e o desvio de meios para as grandes cidades como Lisboa e Porto, António Costa já terá resposta, bastará dizer “mas eu até criei o Ministério da Coesão e uma Secretaria de Estado da Valorização do Interior. Logo, estou aqui para combater isso”. Sabemos que é assim pois já na Cultura, e apesar de quatro orçamentos a executar menos no sector do que no tempo da troika, Costa e a Geringonça respondiam às críticas dizendo: “mas nós voltámos a criar o Ministério da Cultura” como se isso, por si só, resolvesse todos os problemas. Com 70 membros no Governo, o maior da nossa história, não faltarão respostas semelhantes e como tem sido habitual não faltarão visitas, cerimónias e eventos organizados para os 69 mensageiros de António Costa passarem a mensagem virtual/oficial.
Não seria justo escrever esta crítica sem referir que mau exemplo semelhante na organização do executivo foi dado pelo novo Colégio de Comissários Europeus cuja nova orgânica parece privilegiar a mensagem que se pretende transmitir face à possível eficácia do executivo.
É triste constatar que o segundo governo de António Costa volta a ser um executivo de “Agendas” e não de “políticas” já que “agendas mediáticas” não serão mais do que conversa fiada se não incluírem medidas e reformas. Como bem sabemos, o Partido Socialista e a Esquerda são peritos em criar ou seguir “Agendas”, mas péssimos a concretizar. Curioso seria fazer-se um balanço concreto sobre os resultados de algumas das prioridades das agendas mediáticas da Geringonça dos últimos quatro anos e comparar com os resultados obtidos em áreas tão simples como a Saúde, a Cultura, a Educação, a Dívida Pública, o Crescimento ou até a Violência Doméstica.
Duas notas que destoam da gestão destas prioridades: se a reforma da floresta e proteção civil são prioridades do Governo não se percebe como se acabou com a autonomia destas duas pastas que deixam de existir e cujas competências estão agora dispersas noutras áreas. O próprio Capoulas Santos chegou a dizer que a reforma das florestas era a maior desde o tempo de D. Dinis. Agora, António Costa disse que esta nunca foi uma prioridade e acaba com o Ministério da Agricultura, das Florestas e do Desenvolvimento Rural e com a Secretaria de Estado das Florestas e dissolve-as em três secretarias de Estado. Se havia dúvidas de que não era uma prioridade, ficamos com a certeza de que continuará a não ser.
Por outro lado, ainda está por explicar e justificar os objetivos e as razões de haver três pastas como nomes e funções tão semelhantes: ora temos um Secretário de Estado da Valorização do Interior (Isabel Ferreira, do Ministério da Coesão), outro do Desenvolvimento Regional (Carlos Miguel, no Ministério da Coesão), outro do Desenvolvimento Rural (Nuno Russo, no Ministério da Agricultura). Depois de forma mais indireta nas questões regionais, ainda temos um Secretário do Planeamento, outro da Descentralização e da Administração Local. Tendo em conta que, além destes há um sem número de responsáveis políticos com tutelas muito importantes no plano regional, só desejo que o reforço da pretensa prioridade política não resulte numa guerra de egos e competências que acabe por atrasar ainda mais as decisões.
Quanto ao Programa de Governo, e após uma primeira leitura, parece ter dois eixos:
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Garantir como prioridades aquilo em que falharam redondamente durante quatro anos e que recusaram sempre assumir, mentindo aos cidadãos com a conivência e encobrimento do BE, PCP, Verdes e PAN: a degradação do Serviço Nacional de Saúde, dos serviços públicos como os Transportes, a Segurança Social, o Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, os Registos e Notariado, e sem esquecer o combate à corrupção que parece ser finalmente também uma prioridade do PS. Este eixo é uma espécie de confissão póstuma de António Costa. Afinal o PSD tinha razão.
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Apesar da arrogância retórica do PS face aos antigos parceiros de coligação, os acertos feitos entre o Programa eleitoral e o Programa do Governo têm dois objetivos. Por um lado, retirar do programa alguma demagogia eleitoral e por outro “piscar o olho” ao BE, PCP e PAN naquilo que mais os aproxima dos sectores mais à esquerda do PS. Recuam na reforma política, inviabilizando qualquer acordo global nesta matéria. Dizem não às PPP da Saúde (ainda que este não seja um tema pacífico nem dentro do próprio PS) e fazem umas manobras de diversão para PAN e BE verem: não proibimos as touradas, mas concordamos em aumentar a idade mínima para assistir ao espetáculo. Desde que isso os acalme…