CAP juntou a comissária europeia e a ministra Ana Abrunhosa em mais um debate sobre os desafios do mundo rural.
Reconhecendo o papel fundamental e a capacidade de rápida transformação do setor agrícola nesta pandemia, a Comissão Europeia lançou uma “iniciativa única na história da União Europeia, adequada à dimensão desta crise” e que passa, assim seja aprovada pelos Estados-membros e pelo Parlamento Europeu, pela emissão de 150 mil milhões de euros para relançar a economia tendo em conta o reequilíbrio espacial. E nesse enquadramento, Portugal poderá alicerçar o seu relançamento num montante que poderá “duplicar para os próximos anos os fundos estruturais que recebemos: se a proposta for adiante, seremos o oitavo país da União Europeia, com 26 mil milhões para apoios, dos quais 15,5 a fundo perdido”, especificou esta tarde a comissária europeia para a Coesão, Elisa Ferreira.
A intervenção fez parte de mais uma conferência organizada pela Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP) – que a pandemia obrigou a fazer por teleconferência em vez de presencialmente no CNEMA, em Santarém mas que nem por isso foi menos rica em contributos e participação.
Com o interior e a necessidade de encontrar mecanismos para perspetivar um futuro mais integrado para o país em debate, além da importância dos fundos europeus para a reorganização do território e melhor aproveitamento de todo o país houve tempo para detalhar os meios que mais precisam de atenção.

Eduardo Oliveira e Sousa, presidente da CAP
“Num período de forte mudança como o que vivemos, a primeira reação que o mundo agrícola teve foi lançar o lema ‘a agricultura não para’, e a CAP está empenhada em manter sob esse princípio a participação dos agricultores nessa mudança”, sublinhou o presidente da associação de agricultores, Eduardo Oliveira e Sousa. O responsável lembrou a evolução feita ao nível de infraestruturas, nomeadamente rodoviárias, mas sublinhou que o desenvolvimento que agora é preciso atacar para verdadeiramente captar pessoas e atividade para o interior e para o meio rural é distinto: “precisamos de pessoas e empresas, de banda larga, de uma rede elétrica que não falhe pois não há nada pior numa atividade, bem como de outras obras como inovação aplicada à armazenagem de água”, elencou.
Para o presidente da CAP, potenciar chamamento dos jovens para o interior passa também pelas diretrizes que a própria Europa estabeleceu como prioridades, incluindo a aposta nas energias renováveis e as novas tecnologias, “matérias que os jovens abraçam e que podem e devem enquadrar-se nessa modernização”.
“A base territorial, agrícola, das florestas, etc. é fundamental, mas temos de ter cuidado, temos de estudar cada território de forma que ali construamos iniciativas que resultem”, alertou Elisa Ferreira. “Fizemos ultrapassagens de situações muito críticas (isolamento, má qualidade de vida, esgotos…) mas isso de facto não basta. É preciso fontes de dinâmica tal que deem a quem opta pelo interior qualidade de vida e acesso a bens públicos do séc. XXI – desde núcleos e serviços como a educação, a saúde e a assistência a tudo quanto crise uma comunidade e níveis de bem-estar aceitáveis, como o acesso à internet. E daí que o digital esteja associado ao verde na agenda europeia”, frisou Elisa Ferreira.
Concordando que neste momento, mais do que discutir verbas – porque, como constatou Luís Mira, secretário-geral da CAP, essas existem mas nem sempre chegam da melhor maneira ao terreno – o que verdadeiramente importa é discutir o que fazer com elas, a conclusão de que a agricultura com base nas novas tecnologias é a chave foi unânime. Mesmo porque falamos de um “setor inovador e exportador fortíssimo que se revelou uma excelente surpresa pela forma como se transformou e com grande sacrifício neste momento de pandemia”, sublinharam quer a comissária europeia quer a ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa, que fez igualmente parte desta sessão dedicada ao tema Coesão Territorial e Como Evitar o Abandono das Zonas Rurais.

A ministra da Coesão Territorial, Ana Abrunhosa. (JOSÉ COELHO/LUSA)
“Quando falamos de coesão não estamos a focar-nos apenas no interior mas num desenvolvimento equilibrado do país e é nessa perspetiva que devemos olhar com atenção o mundo rural”, defendeu Ana Abrunhosa, lembrando que este não é apenas a produção agrícola mas inclui a floresta, o turismo e deve incluir outros modelos adaptados a zonas rurais. Quais? “Porque não pensarmos em localizar ali atividades de conhecimento e inovação, laboratórios colaborativos, respostas distintas que a experiência anterior nos diz capazes de funcionar na captação e fixação de população e em simultâneo diversificar a base económica desses territórios”, sugere a governante.
Para Ana Abrunhosa, que elogia quer o comportamento de todo o setor agrícola nesta crise quer a disponibilidade sem precedentes da Europa para se mobilizar e encontrar soluções rápidas, estratégicas e concertadas para responder a este momento, é essencial o envolvimento de todos no desenho destas estratégias que permitam reequilibrar a população e a riqueza no país. E naturalmente defende também que para tal acontecer é preciso que haja um esforço de transferir qualidade de vida para essas regiões, de forma que quem não vive nos grandes centros urbanos não seja penalizado por isso. “É preciso haver igualdade de acesso, de serviços, de oportunidades, de qualidade de vida. Não temos interesse nenhum em sobrepopular o interior, mas só conseguiremos aliviar o excesso de pressão nas cidades quando quem vive no mundo rural tenha acesso a qualidade de vida e oportunidades iguais à restante população.”
Foram os pontos mais importantes focados em mais um debate inserido na iniciativa da CAP “A Agricultura num Mundo em Mudança” – que já contou também com as contribuições de Paulo Portas sobre Geopolítica e Geoeconomia: Tendências, Riscos e Oportunidades da Agricultura no Mundo Pós-Covid.