Todos os anos a equipa da AGROGES analisa detalhadamente os resultados das Contas Económicas de Agricultura (CEA) sendo possível concluir, com base nos dados mais recentemente disponibilizados, que, em 2024, a quase totalidade dos indicadores económicos analisados apresentavam resultados mais favoráveis do que ano de 2023 e do que a média dos resultados atingidos na década anterior, em relação:
- ao produto e ao rendimento do sector agrícola;
- à produção e à produtividade dos factores de produção agrícola;
- à produtividade, à competitividade e ao rendimento das explorações agrícolas;
- ao sistema de apoios públicos aos produtores agrícolas.
Da análise dos dados do Quadro 1 podem-se retirar as seguintes principais conclusões.
Quadro 1 – Evolução do produto e do rendimento do sector agrícola em 2024 face a anos anteriores (%/ano)
Primeiro, que a variação, entre 2023 e 2024, do produto agrícola bruto em volume[1] gerado pela agricultura portuguesa foi de +7,9%, várias vezes superior às correspondentes taxas de crescimento médio anual verificadas nos últimos cinco anos (-1,3%/ano) e na última década (-0,2%/ano).
Segundo, que o produto agrícola bruto em valor[2] decresceu ligeiramente (-0.8%) entre 2023 e 2024, o que contrasta com os acréscimos mais que cinco vezes superiores aos observados para as correspondentes taxas de crescimento médio anual nos últimos cinco anos (+5,2%/ano) e na última década (+4,7%/ano).
Terceiro, que o rendimento do sector agrícola[3] teve, entre 2023 e 2024, um crescimento (+15,9%), cerca de três vezes superior às correspondentes taxas de crescimento médio anual observadas nos últimos cinco anos (+5,1%/ano) e na última década (+4,2%/ano).
Quarto, que a diferença entre as variações nos últimos anos dos valores a preços constantes (em volume) e a preços correntes (em valor) do produto agrícola bruto são consequência da evolução negativa observada para a relação entre os preços dos produtos e dos factores de produção[4], a qual é, em grande parte, explicada pelo valor muito elevado que tal relação apresentou no ano de 2023.
Quinto, que o grande diferencial observado entre o rendimento e o produto agrícola em valor do sector agrícola português, entre 2023 e 2024, é explicado pelo enorme crescimento atingido pelos apoios directos ao rendimento dos produtores agrícolas[5], os quais são em parte consequência dos valores reduzidos dos apoios contabilizados no ano de 2023 e resultantes principalmente dos aumentos observados pelos pagamentos aos produtores, separados da produção, que na sua maioria dizem directamente respeito ao pagamento de serviços prestados à colectividade pelos produtores agrícolas e não a outros subsídios à produção como erradamente a designação adoptada pelas CEA dá a entender.
A principal conclusão que se pode retirar da análise dos dados do Gráfico 1 é de que, contrariamente ao verificado, em média, na última década, foi possível fazer crescer, entre 2023 e 2024, o volume da produção agrícola[6] mais do que o volume dos bens intermédios e de capital consumidos [7], em conjugação com uma menor redução do volume da mão-de-obra agrícola[8] utilizada. Desta evolução resultaram ganhos de produtividade, entre 2023 e 2024, superiores à média da última década, quer em relação ao factor trabalho[9], quer em relação, principalmente, aos factores de produção intermédios e de capital[10], cujo valor positivo (+1,9%) contrasta com o valor negativo observado na última década (-1,1%).
Gráfico 1 – Evolução da produção, dos consumos intermédios e de capital e das unidades de trabalho e das respectivas produtividade em 2024 face a anos anteriores
No que se refere aos dados do Gráfico 2, importa sublinhar os seguintes aspectos.
Primeiro, que entre 2023 e 2024 a produtividade[11] e o rendimento[12] médios das explorações agrícolas portuguesas cresceram, respectivamente, 11,9 e 16,2%, variações anuais estas muito superiores às correspondentes taxas de variação média anual observadas, quer nos últimos cinco anos, quer na última década.
Segundo, que o desempenho económico da competitividade média das explorações agrícolas[13] neste último ano foi negativo (-5%), contrariamente ao observado, em média, tanto nos últimos cinco anos (+3%/ano), como na última década (+4,9%/ano).
Os diferenciais observados, entre 2023 e 2024, para os três indicadores em causa, são, no entanto, consequência, quer da evolução desfavorável da relação entre os preços dos produtos e dos factores intermédios de produção, quer do aumento muito significativo verificado nos apoios públicos directos aos rendimentos dos produtores agrícolas.
Gráfico 2 – Evolução da produtividade, competitividade e rendimento das explorações agrícolas em 2024 face a anos anteriores
No que diz respeito ao comportamento dos preços agrícolas entre 2023 e 2024, os dados disponíveis permitem-nos concluir que:
- enquanto o preço no produtor dos consumos intermédios decresceu, em média, -3,7%, com destaque para as variações observadas para os adubos e correctivos do solo (-17,3%) e para os alimentos para animais (-7,6%);
- os decréscimos nos preços no produtor dos produtos foram, em média, superiores (-5,3%), com destaque para os cereais (-10,4%), os produtos hortícolas (-9,8%), os frutos (-4,1%), o azeite (-29,3%), a carne de suínos (-6%) e o leite (-9,6%).
Relativamente ao comportamento dos apoios directos ao rendimento dos produtores agrícolas resultante das políticas em vigor nos anos de 2023 e 2024, importa realçar o significativo acréscimo total verificado (+98,5%), o qual resultou, principalmente, do aumento verificado nos chamados Outros subsídios à produção (+128,4%), aumento este superior ao observado para os chamados subsídios aos produtos (+30,8%).
Em nosso entender, estas designações atribuídas a estes dois tipos de apoios públicos aos produtores são erróneas e como tal deviam ser substituídos, no caso dos Subsídios aos produtos, por Subsídios à produção e, no caso dos Outros subsídios à produção, por Pagamento dos serviços prestados pelos produtores à colectividade, cuja justificação deixaremos para um próximo artigo técnico a ser publicado no site da AGROGES.
Recorrendo a estas novas designações pode-se concluir dos dados do Gráfico 3 que:
- a importância relativa dos apoios directos aos rendimentos dos produtores no correspondente rendimento do sector agrícola cresceu de 15,7% em 2023 para 27,8% em 2024, percentagem esta muito próxima dos respectivos valores médios alcançados, quer nos últimos cinco anos (24,3%), quer na última década (24,7%);
- o peso relativo dos subsídios à produção reduziu-se cerca de 12 pp ente 2023 e 2024, sendo este último valor (21%) da ordem dos observados em média para os últimos cinco anos e para a última década;
- a importância relativa dos pagamentos dos serviços prestados pelos produtores agrícolas à colectividade aumentou, entre 2023 e 2024, de 67 para 79%, percentagem esta da ordem da observada em média nos últimos cinco anos (78,4%) e na última década (79,9%).
Gráfico 3 – Níveis de apoio público aos produtores agrícolas em 2024 e em alguns anos anteriores
[1] Medido pelo valor acrescentado agrícola bruto a preços no produtor constantes
[2] Medido pelo valor acrescentado agrícola bruto a preços no produtor correntes
[3] Medido pelo valor acrescentado agrícola bruto a custo de factores e preços nominais
[4] Medido pelo rácio entre o índice de preços no produtor implícitos dos produtos e dos factores de produção
[5] Medido pelo somatório dos chamados Subsídios aos produtos e Outros subsídios à produção
[6] Medido pela produção do ramo agrícola a preços no produtor constantes
[7] Medido pelo total dos consumos intermédios e de capital a preços constantes
[8] Medido pelo número de unidades de trabalho ano agrícola (UTA)
[9] Medido pelo rácio entre produção do ramo agrícola a preços no produtor constantes e o volume de mão-de-obra agrícola em UTAs
[10] Medido pelo rácio entre a produção do ramo agrícola a preços no produtor constantes e o somatório dos consumos intermédios e de capital a preços constantes
[11] Medido pelo valor acrescentado líquido a preços constantes por UTA
[12] Medido pelo rendimento dos factores a preços reais por UTA
[13] Medido pelo valor acrescentado líquido a preços no produtor reais por UTA
Professor Catedrático Emérito do ISA, UL e Coordenador Científico da AGRO.GES
Manuela Nina Jorge
Diretora Geral da AGRO.GES