Foi anunciado recentemente que o governo aprovou uma Resolução do Conselho de Ministros que determina à Infraestruturas de Portugal, S.A. (IP, S.A.) o desenvolvimento de projetos rodoviários prioritários, onde se inclui o estudo de túnel rodoviário submerso entre a Trafaria e Algés, no pacote rodoviário aprovado pelo Governo. Esta é uma das 31 obras rodoviárias aprovadas em Conselho de Ministros, sem que se conheça qualquer fundamentação técnica para tal decisão. A mobilidade neste eixo é um desafio urgente, mas a solução não deve passar pela criação de mais infraestruturas rodoviárias que apenas perpetuam a dependência do automóvel e vão contra a estratégia climática nacional, que vincula o país a reduzir as emissões de gases com efeito de estufa. Defendemos que esta ligação deve, pelo contrário, basear-se em modelos de transporte mais eficientes, ecológicos e inclusivos, nomeadamente através do reforço dos serviços ferroviários e fluviais. Consequentemente, apontamos 6 medidas de baixo e médio investimento que devem ser equacionadas, em alternativa a um projeto faraónico que perpetua a desigualdade no acesso e nos afasta dos compromissos internacionais que urge cumprir.
Medidas prioritárias de baixo investimento e curto prazo (2025):
1. Melhoria da qualidade do serviço fluvial no rio Tejo: Investir na frequência e qualidade das ligações fluviais, especialmente na ligação Trafaria-Belém, tornando-a uma alternativa eficaz ao transporte rodoviário. Atualmente, os barcos Trafaria-Belém circulam apenas de hora em hora e encerram o serviço às 21h ou 22h. É essencial garantir uma frequência mais regular e um funcionamento alargado no período noturno.
2. Reativação do terminal fluvial de Algés: Avaliar a viabilidade de reativar este terminal para estabelecer uma ligação fluvial direta entre a Trafaria e Algés, com uma frequência regular.
3. Reforço da capacidade dos comboios da Fertagus: Com o aumento da procura desde 2019, impulsionado pela introdução dos passes Navegante AML, e desde dezembro de 2024, com o aumento da frequência dos comboios desde Setúbal, torna-se necessário ampliar a capacidade de transporte. O Governo deve priorizar a aquisição urgente de novo material circulante.
4. Corredores BUS no acesso à Ponte 25 de Abril: Introduzir a Sul e a Norte da Ponte 25 de Abril corredores dedicados ao transporte público rodoviário de grande capacidade, que respondam com maior flexibilidade a pares de origem e destino menos densos e estejam integrados na rede metropolitana de corredores dedicados ao transporte público rodoviário.
Medidas prioritárias de médio investimento e médio prazo (2030):
5. Expansão do Metro Sul do Tejo à Trafaria: Concluir o projeto e a execução da extensão do Metro Sul do Tejo da Universidade até à Costa da Caparica e Trafaria.
6. Expansão do Metro Sul do Tejo a Alcochete: Tal como já previsto em diversos instrumentos legais e de planeamento, executar a expansão do Metro Sul do Tejo ao Seixal-Barreiro-Alcochete.
A necessidade de um planeamento estratégico
A mobilidade urbana entre os concelhos da Margem Norte e Sul exige um investimento robusto e estratégico nos transportes públicos, bem como nas redes de mobilidade activa que os alimentam, com vista a garantir um sistema coerente, fiável, eficiente e inclusivo. Concretamente, deverá investir-se i) em melhor oferta e maior articulação entre todos os operadores de transporte público (ferroviário, fluvial e rodoviário), tendo por base uma visão de rede de escala metropolitana; ii) numa rede ciclável robusta, contínua, segura e apelativa, que ligue os aglomerados aos transportes públicos de alta capacidade (estima-se que esta rede permitirá triplicar o número de cidadãos da AML que residem a menos de 10min desses mesmos transportes); iii) numa rede pedonal qualificada e igualmente coerente, já que a disponibilidade para andar a pé até ao transporte público depende grandemente do conforto, da segurança e da qualidade dos percursos. Quanto mais bem integradas estiverem as várias redes, mais atractivos se tornam os meios de mobilidade alternativos ao automóvel privado e mais se desincentivará o seu uso.
Nenhuma obra de mobilidade de grande investimento deve ser iniciada sem estar devidamente integrada em instrumentos de gestão territorial aprovados e sem os respetivos estudos de mobilidade. Além disso, é fundamental promover uma maior coesão territorial, criando mais empregos na Margem Sul, reduzindo assim as deslocações diárias de automóvel.
Apelo às entidades competentes
A solução para a mobilidade entre a Margem Sul e a Margem Norte da Área Metropolitana de Lisboa, não pode continuar baseada no transporte individual. A aposta imediata no reforço dos serviços de transporte público – ferroviário, fluvial e rodoviário – é a alternativa lógica para um futuro mais sustentável, eficiente e acessível para todos.
Exigimos que estas alternativas sejam consideradas pelo Governo e pelas entidades responsáveis pelo planeamento e mobilidade, nomeadamente o Ministério das Infraestruturas e Habitação, Infraestruturas de Portugal (IP), Instituto da Mobilidade e dos Transportes (IMT), Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional de Lisboa e Vale do Tejo (CCDR LVT), Câmara Municipal de Almada, Câmara Municipal de Oeiras, Transportes Metropolitanos de Lisboa (TML) e Agência Portuguesa do Ambiente (APA).
Este apelo é subscrito pelas entidades e coletivos:
• ACA-M – Associação de Cidadãos Auto-Mobilizados
• Associação Inspira Mobilidade
• Associação Último Recurso
• ATERRA – Movimento pela redução do tráfego aéreo e por uma mobilidade justa e ecológica
• Centro de Arqueologia de Almada
• Centro de Vida Independente
• CUTMS – Comissão de Utentes dos Transportes da Margem Sul
• Estrada Viva
• Estuário colectivo
• GEOTA – Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente
• ICVM – Instituto de Cidades e Vilas com Mobilidade
• MUBi – Associação pela Mobilidade Urbana em Bicicleta
• QUERCUS – Associação Nacional de Conservação da Natureza
• Rede para o Decrescimento
• the Future Design of Streets association
• ZERO – Associação Sistema Terrestre Sustentável
Fonte: ZERO