Trabalho realizado pela Universidade de Aveiro para o ICNF estima a existência de 830 541 gatos e 101 015 cães errantes em Portugal Continental.
O primeiro Censo Nacional dos Animais Errantes estima que existam em Portugal Continental mais de 930 mil animais errantes, entre eles 830 541 gatos e 101 015 cães.
O censo, desenvolvido para o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) e financiado pelo Fundo Ambiental, inclui um estudo de atitudes e perceções que determina os aspetos psicométricos da população portuguesa face às práticas de detenção responsável, em relação à presença e impactos de animais errantes, e a estratégias para controlar e reduzir as suas populações.
Os principais resultados do Censo Nacional de Animais Errantes 2023 apontam para cenários muito distintos entre gatos e cães.
Os detentores de gatos têm menores índices de responsabilidade do que os de cães, especialmente ao nível da identificação individual e do acesso ao exterior sem supervisão: 29% dos donos de gatos permitem o acesso ao exterior sem supervisão e 35% tem pelo menos um gato sem identificação e registo. Mais de um terço dos gatos (39%) já caçou e a esterilização cirúrgica é o método mais usado para prevenir ou impedir a sua reprodução (95,4%).
Dos inquiridos detentores de gatos, a maioria (26,8%) era detentora de apenas um ou dois (26,8%) gatos, mas alguns detinham três (17,2%), quatro (7,8%), cinco (5,4%), ou mais de cinco (14,7%), sendo o principal motivo a companhia (78%). A obtenção de gatos foi referida como sendo principalmente de animais encontrados (68,6%), adotados em abrigos (29,5%) ou oferecidos por amigos ou familiares (19,6%). Uma pequena parte dos inquiridos aponta a aquisição de animais a criadores (4%) através da internet (3,8%), ou por criação própria (2,7%).
No que respeita aos gatos errantes, apenas 5,3% dos inquiridos referem que já se sentiram fisicamente ameaçados por um gato errante e 5,9% já foram efetivamente atacados. Quanto à prestação de cuidados a gatos errantes, 83,4% dos inquiridos já providenciaram alimento, 78,6% água, 48,3% abrigo, e 14,1% já prestou outros cuidados.
Já os cães registam elevados índices de detenção responsável: 92% dos detentores de cães identificam e registam todos os seus animais e 92% nunca permitem o acesso ao exterior sem supervisão, enquanto 25% referem que não usam nenhuma forma de contraceção nos seus animais e 28% relatam que os seus cães já caçaram. A maioria dos inquiridos era detentora de apenas um (45,2%) ou dois (24,1%) cães e a principal motivação para a detenção de cães foi a companhia (88%), sendo que 9% dos inquiridos referem a detenção por motivos utilitários. Aproximadamente um em cada quatro detentores (23,9%) adquiriu animais a criadores (17,2%), através da internet (5,3%) ou em lojas de animais (1,4%).
Quanto aos cães errantes, 27,2% referem já ter-se sentido fisicamente ameaçados por um cão errante, dos quais 7,2% já foram atacados.
Mais de dois terços (70,5%) dos inquiridos já providenciaram alimento a cães errantes, 65,2% já providenciaram água, 37,1% abrigo, e 17,1% já prestaram outros cuidados.
O censo revela, ainda, que valores menores de rendimento das famílias e maior índice de desigualdade estão associados a maiores densidades de animais errantes, sugerindo que as dificuldades económicas são um dos fatores que limita comportamentos de detenção responsável. Estes resultados são corroborados pelos resultados dos inquéritos, em que o custo é identificado como a maior barreira à esterilização dos animais.
No que toca ao impacto dos animais errantes na fauna silvestre, foram identificadas 334 espécies silvestres, das quais 201 (60,2%) são vulneráveis à predação por gatos e 143 (48,2%) à predação por cães, devendo este estudo ser aprofundado, segundo os investigadores.
Relativamente às colisões rodoviárias, segundo dados da GNR compilados no estudo, em Portugal continental foram reportados 4640 atropelamentos, sendo de 4443 cães e 197 gatos entre 2019 e 2022, tendo 2020 sido o ano em que se reportaram mais atropelamentos (1428 e 84, respetivamente).
No âmbito do estudo, foi ainda criada a aplicação Errantes (disponível para Android e iOS, desenvolvida pela Universidade de Aveiro em colaboração com o ICNF, que permite que cada utilizador registe os seus dados e os dados dos seus animais de estimação, bem como avistamentos de animais que circulam livremente, ou de presas capturadas por animais com ou sem detentor.
“A sociedade civil é um agente fundamental para a resolução da existência de animais errantes, sendo premente a sua sensibilização para esta temática, aumentando o seu conhecimento sobre os impactos provocados, medidas de gestão, e envolvendo-a nas várias componentes da Estratégia Nacional para os Animais Errantes. Os resultados de Censo evidenciam uma forte preocupação social com o bem-estar dos animais errantes, o que constitui um sólido argumento para futuras campanhas de sensibilização e modificação de comportamentos. Contudo, pode também constituir uma barreira à modificação de comportamentos que contribuem para a manutenção ou crescimento das populações de animais errantes, como por exemplo a alimentação não controlada, com receio de que passem fome, ou a não comunicação de animais errantes às instituições responsáveis, com receio de que sejam abatidos ou enjaulados para o resto da vida”, sublinha Alexandra Pereira, diretora do departamento do Bem-Estar dos Animais de Companhia do ICNF.
De salientar que a preocupação da sociedade com o bem-estar dos animais errantes foi a mais consensual nos inquéritos. No que diz respeito à existência de populações de animais errantes, a tendência geral evidente nos inquéritos de atitudes e perceções sociais reflete uma preferência para que não existam ou existam menos animais errantes e de que as populações devem ser reduzidas, desde que não seja comprometido o bem-estar dos animais.
O trabalho desenvolvido permitiu ao ICNF reajustar a Estratégia Nacional para os Animais Errantes, em consulta pública em 2023, reforçando a sensibilização da população para a detenção responsável dos animais de companhia, bem como a capacitação de profissionais nas áreas de avaliação do bem-estar animal, entre outras matérias.
Neste contexto, encontra-se a decorrer a primeira edição da pós-graduação em Medicina de Abrigos e Bem-Estar dos Animais de Companhia, em parceria com a Universidade do Porto, com o objetivo de capacitar médicos veterinários do ICNF e dos municípios na área da medicina de abrigo.
O Censo Nacional de Animais Errantes 2023 foi desenvolvimento pelo Departamento de Biologia e pelo Centro de Estudos do Ambiente e do Mar da Universidade de Aveiro e financiado pelo Fundo Ambiental, podendo ser consultado aqui.
Fonte: ICNF