As especificidades das agriculturas de Portugal assentam no predomínio de solos de média a baixa fertilidade, pouco profundos, pedregosos, com prevalência de problemas de drenagem interna ou externa (muitos dos solos de melhor fertilidade encontram-se junto a linhas de águas, sujeitos a regimes de cheias) e na forte irregularidade climática. Esta última traduz-se em concentração de precipitações em períodos temporais de outono-inverno-primavera, cujas temperaturas são muito baixas para as necessidades das plantas, impedindo o adequado crescimento e desenvolvimento, apesar de haver água no solo.
O oposto também acontece no verão, devido às mudanças climáticas: a temperatura estival é favorável à fisiologia vegetal de crescimento e produção, mas não há água disponível no solo para as raízes extraírem, por falta de precipitações durante largos períodos. Desta forma, muitas produções agrícolas não conseguem atingir o seu patamar mínimo de quantidade e qualidade porque falta água aos processos fisiológicos vegetais.
É necessário caminhar para o “sequeiro assistido”, água retida em charcas, para disponibilizar água aos ecossistemas e culturas no outono e primavera. Ao mesmo tempo, incrementar a superfície agrícola utilizada (SAU) em regadio, os vegetais terem a água necessária e suficiente durante o verão para terem melhores e maiores produções, o que se traduz em maior valor acrescentado por hectare, (infelizmente a superfície irrigável é inferior a 20% da SAU total de Portugal).
As terras mais férteis do país, solos ricos em matéria orgânica e nutrientes, com boas drenagens internas, profundas, etc. sustentáveis e altamente produtivas, estão predominantemente localizadas nas regiões Norte, Centro, Ribatejo e Oeste.
Com estruturas fundiárias de pequenas ou micro dimensões, seja na dimensão da parcela, seja na exploração (hectares por exploração: 14,4 – Portugal Continental; 4,8 – Entre Douro e Minho; 6,9 – Trás-os-Montes; 2,9 – Beira Litoral; 11,7 – na Beira Interior; 11,9 – Ribatejo e Oeste; 68,9 – Alentejo e 7,9 – Algarve) é impossível gerar valor acrescentado nas Agriculturas de Portugal e estancar o despovoamento do Interior. Mesmo as regiões com maior estrutura fundiária, Alentejo, provavelmente terão que a ampliar as respetivas superfícies por exploração, dado terem predominantemente atividades extensivas de sequeiro com margens brutas escassas por unidade de superfície. Precisam do aumento da superfície de exploração para se tornarem sustentáveis.
Embora a média dimensão das explorações nacionais esteja a subir desde 2009, 12,0 para 13,7 hectares por exploração em 2019, mesmo assim 3 hectares abaixo da média dos países da UE.
Isto espelha uma realidade muito díspar: existe um número muito elevado de micro e pequenas explorações (73%), contrapartida de superfície pequeníssima da SAU (4%); e, como contraponto, há um número pequeno de explorações com dimensão muito grande (4% em número, média 220 ha/exploração) que têm um peso elevado na soma das superfícies de exploração (mais de 50% da SAU). Das 290 229 explorações agrícolas portuguesas, 208 739(71,9%) são responsáveis por 8,3% VPPT (Valor da Produção Padrão Total) abaixo de 8 000€, 45 614 (15,7%) 9,4% do VPPT com valores entre 8 000 e 25 000€, 24236 (8,4%) 17,6% do VPPT entre 25 000€ e 100 000€ e 11 640 (4,0%%) representam 64,8% do VPPT acima de 100 000€.
As agriculturas de Portugal sempre foram dominadas pelo minifúndio/microfúndio, que mantém um predomínio das agriculturas e economias do mundo rural de subsistência, responsáveis pelo despovoamento e falta de coesão territorial. Este tipo de Agricultura já originou no século XX fortes fluxos migratórios para a cidade e países da Europa, principalmente França e Alemanha. No final do século XIX o mesmo tinha ocorrido, mas desta vez para o Brasil. Hoje temos menos de 5% de mão de obra na Agricultura, ainda medianamente mecanizável e com uma dimensão de estrutura fundiária que não permite fixar jovens agricultores e dar sustentabilidade económica à maioria dos estão na atividade.
Os emparcelamentos que se fizeram por todo o país acabaram por passar de um minifúndio com mais parcelas para outro minifúndio que nada resolve, nem no valor acrescentado, nem na rentabilidade. Acresce que são processos com custos elevados e resultados incipientes: Emparcelamento Rural; Valorização Fundiária; Bolsa Nacional de Terras; Programa de Transformação de Paisagem (PTP): Programas de Reordenamento e Gestão da Paisagem (PRGP); Operações Integradas de Gestão da Paisagem (OIGP); Áreas Integradas de Gestão de Paisagem (AIGP); Emparcelar para Ordenar, etc.
Os políticos em Portugal terão rapidamente de planear a forma de criar explorações cujas superfícies de atividade tenham como resultados a fixação das pessoas, sejam rentáveis e produtivas, para a maioria das culturas em regadio e superfície superior a 10 hectares. Devem assentar nos princípios da permilagem, com poucos ou muitos proprietários, gerar unidades indivisíveis assentes em princípios sólidos e robustos do ponto de vista jurídico. As unidades deverão ter respeito pelos locais originais sem alteração dos ecossistemas de elevado valor natural.
Os pilares políticos para robustecer as agriculturas de Portugal e da estrutura fundiária que defendemos são:
1.ª Prioridade: Financiar através do PEPAC todas as candidaturas aprovadas referentes à primeira instalação de jovens agricultores, com abertura contínua de candidaturas, durante o período temporal de vigência deste quadro financeiro plurianual, com o objetivo de passar dos 3,9 % dos agricultores jovens da atualidade para os 11% da média europeia em 2030, mesmo que tenha de ser reprogramado o PEPAC para fechar as restantes Medidas e Ações. Na primeira instalação de jovens agricultores (ou reconversões profundas de atividades nas explorações, agricultura familiar) é impossível prescindir dos fundos financeiros públicos de apoio ao investimento através de Incentivos Não Reembolsáveis (INR), mínimo de 25%, média 50%, caso contrário não há rentabilidade dos investimentos;
2.ª Prioridade: Garantir a existência, ao longo de todo o período temporal de vigência do PEPAC, de empréstimos bancários de muito longo prazo (30 anos; 7 anos de carência) para apoio à compra de terra, outra prioridade, apoiar os jovens empresários agrícolas complementarmente aos INR, pagamento de tornas a co-herdeiros e compra de prédios rústicos confinantes por parte de proprietários há mais de 5 anos (orçamento robusto negociado pelo governo de Portugal junto do BEI, com montante mínimo de pelo menos 1 250 M€/ano, durante 4 anos);
3.ª Prioridade: Crédito bancário para investimento de sócios de Organizações de Produtores e Cooperativas (empréstimo BEI de 1 000 M€/ano), sendo empréstimos com vigência temporal 15-20 anos e 3-5 anos de carência em função da atividade agrícola, tempo necessário para se conseguir o equilíbrio da tesouraria.
Reiteramos as afirmações para memória futura:
– Sem políticas públicas ativas que atuem sobre a estrutura fundiária é impossível gerar valor acrescentado nas Agriculturas de Portugal e assim sendo, é impossível estancar o despovoamento e fazer efetiva coesão territorial!
– Mais, com este conjunto de medidas de política publica para a agricultura, junto com a gestão do Ministério da Agricultura no sentido de tramitar os processos burocráticos dentro dos prazos legais, podemos atingir, até 2030, a eliminação do défice alimentar em valor (5200 M€ em 2023).
Anselmo Mendes
Enólogo, empresário
José Martino
Consultor em Desenvolvimento Territorial, empresário